Dedicado aos jovens de qualquer idade
Em meio a tantas ideias, formas de manifestação e novidades para muitos, escrevo na tentativa de organizar algumas frases, mesmo sabendo que corro o risco de ser bem primária nessa organização. Após assistir a deflagração de quatro atos em favor da redução da passagem de ônibus em São Paulo, não pude deixar de ir ao quinto (sem duplos sentidos).
Em meio a tantas ideias, formas de manifestação e novidades para muitos, escrevo na tentativa de organizar algumas frases, mesmo sabendo que corro o risco de ser bem primária nessa organização. Após assistir a deflagração de quatro atos em favor da redução da passagem de ônibus em São Paulo, não pude deixar de ir ao quinto (sem duplos sentidos).
Primeiramente, temos na rua toda
uma geração que não tem experiência de luta. Está sendo apresentada e se apresentando
agora. Resultado não apenas da pouca idade da maioria dos manifestantes, como
também da conjuntura que vive o país. Essa geração vive uma situação que “trava”
muito das lutas ditas “tradicionais”, uma vez que estão saindo do Ensino Médio e
até das universidades, para um mercado de trabalho que mesmo quando formal, está
cada dia mais precarizado. “Ter direitos” parece uma expressão cada vez mais
alienígena, pois a maioria nem chega a experimentar dos “antigos” direitos
trabalhistas. A última vez que o povo foi dessa forma para as ruas ficou lá
atrás, em 1992, com o “Fora Collor”. Ou seja, os jovens que agora estão nessas
manifestações não lutaram antes não porque não quiseram, mas porque a
oportunidade histórica ainda não havia se apresentado. E quando a mesma apareceu,
essa juventude não se furtou em agarra – la com todas as forças.
Em segundo lugar e não menos
importante, é que ainda vivemos sequelas dos “anos de chumbo”. A Ditadura
Militar deixou marcas tão sérias que hoje vemos jovens gritando contra a
presença de partidos políticos nas manifestações. Ou seja, além de convencer a muitos
de que lutar não resolve nada e ainda é muito perigoso, incutiram também a
ideia de que partido político é algo nefasto. E aí a confusão vai longe, pois
todos os presentes em uma manifestação de rua já tomaram partido. Por outro
lado, a atuação dos partidos políticos burgueses após o fim da ditadura tornou
o cenário cada dia mais despolitizado. Na verdade, o povo desconfia dos
partidos porque sabe que o sistema não funciona a seu favor, mas não sabe como
canalizar isso e distorce o significado de partido.
Após séculos de deturpação da história
brasileira, e a condução sistemática do ensino de história nas escolas do país
ao longo do século XX, também carregamos outros problemas nas costas. O mito do
brasileiro quieto, sem grandes lutas, sem grandes revoltas. O mito do
brasileiro “acordando agora”. Basta ler só um pouquinho de um livro didático de
História atual para verificar grandes lutas do povo brasileiro. O Quilombo de
Palmares, a Cabanagem, a greve de 1917, a resistência na Era Vargas, a
resistência na Ditadura Militar. Quantas greves nos anos 80, 90 e no século XXI.
Só para começar. Que povo corajoso, que nunca sucumbiu! Quantos heróis!
A partir dessas manifestações,
uma geração experimenta a luta, descobre sua voz e a vontade de lutar. Os
canais? Pequenos pontos, como a passagem de ônibus. Mal sabem que até
revoluções já começaram com coisas assim. Mas ainda não sabem muito bem o que
fazer com isso. Estão nas ruas. Levam cartazes, tiram fotos, convidam os
amigos. As redes sociais tiveram papel preponderante nesse processo, sem
dúvida. Vivemos uma nova forma de organização e denúncia em tempo real. Quem
não se atualizar, vai ficar para trás. Mas como cobrar dessa geração uma
experiência histórica que ela não teve? Tem agora, e agora vai aprender. O
resultado? Imprevisível, como sempre. Pode ser que acabe apenas como mais um
ato de rua. Pode ser que se transforme em algo muito maior. De qualquer
maneira, a luta educa e ensina, através da experiência. Esses jovens nunca mais
serão os mesmos, depois de experimentarem o gostinho da luta, da rebeldia, da
insubmissão.
Da minha parte, entrei em mais
uma luta depois de vinte anos sem parar. Quem já viveu organizado em movimentos,
partidos políticos e sindicatos, sabe que essas manifestações são
importantíssimas, mas é preciso ter muita paciência. O que meus olhos viram
hoje nas ruas da minha cidade natal foi muito bonito. A maioria era jovem, mas
encontrei muitos da minha idade e até mais velhos. Também encontrei velhos
conhecidos, e conversei com gente que nem conheço. Andei aproximadamente 15
quilômetros em um ambiente extremamente agradável. Casais de namorados, grupos
de amigos, gente segurando cartolinas. Gritei palavras de ordem até bem
humoradas, situação à qual não estou muito acostumada, por ouvir coisas bem
mais duras na vida sindical.
E algumas coisas chamaram bastante
a minha atenção. Qualquer tentativa, por mais tímida, de atos de depredação ou
violência, foi prontamente corrigida pela multidão. Uma tentativa de pichação,
e uma bombinha dessas que explodem aos montes em escolas, foram repelidas
imediatamente com “Violência não!”. Fiquei surpresa com a rapidez e
determinação dessa reação. Por outro lado, também pude conferir uma população
simpática a tudo isso. Salvo por raríssimas exceções, os motoristas presos no
trânsito nos fotografavam e filmavam como se fossemos celebridades. Alguns
riam, outros buzinavam em ritmo a pedidos. E muitos desses motoristas ganharam
flores de presente. Até motoristas de ônibus e seus passageiros queriam
registrar o momento. E ia quase me esquecendo das pessoas que penduraram e
acenaram panos brancos na janela, também em apoio à multidão.
É claro, sempre vamos ouvir a
reação chamando de vandalismo, baderna, arruaça, sem sentido, modinha. Mas para
quem tem “20 anos de praia”, “nada de novo no front”. Isso faz parte do
processo. Eu não seria louca de virar as costas para essa movimentação, sabendo
de sua importância a médio e longo prazo. Na Rússia, em 1905, uma manifestação
pacífica duramente reprimida caminhou até uma revolução anos depois, em 1917.
Nunca podemos desprezar o aprendizado popular.
Poder viver para ver é muito bom.
Poder participar, melhor ainda.
Vem, vem, vem pra rua vem...contra o aumento!
Vem, vem, vem pra rua vem...contra o aumento!
Excelente, Alessandra
ResponderExcluirParabéns pelo texto maravilhoso!
Abraço,
Valter.
Excelente! Muito bom!
ResponderExcluirAdmiro!